As mudanças repentinas nos preços de passagens aéreas deixam muita gente de cabelo em pé. Não são poucas as histórias de saltos que fazem muitos passageiros desistirem de viajar. Mesmo na tentativa de proteger os preços, o setor aéreo amargou grandes prejuízos nos últimos 10 anos.
Os altos custos operacionais e a baixa renda da população brasileira tentam explicar a pouca performance. Mas se agora o novo normal será ter uma economia encolhida, e viajantes ainda menos propensos a entrar em um avião, como as companhias aéreas irão conseguir se manter?
Só para lembrar, o dinheiro do governo não é infinito e tem um custo, que mais cedo ou mais tarde vai entrar nos balanços de resultados das empresas. Então como ter saúde financeira para continuar operando e servindo a população com esse serviço tão essencial?
O tradeoff entre taxa de ocupação e receita por passageiro é o maior vilão nesse dilema. O mercado aéreo tem uma conta de padaria que diz que para atingir o breakeven um avião tem que voar com 80% da ocupação.
Em um cenário de baixa demanda ou de restrições sanitárias severas (como deixar livre o assento do meio), esse percentual não será atingido e vai valer mais a pena deixar o avião no chão.
Fato que ninguém quer isso. A indústria aérea é um motor para a dinâmica econômica do país. Não ter uma indústria aérea saudável e funcionando impacta ainda mais nossa economia e gera um círculo vicioso.
Mas se a ocupação vai cair e mais aviões estarão em solo, pressionando custos e a necessidade de receita dos aviões em operação, qual será o reflexo na dinâmica de preços?
A resposta simples e imediata é: os preços vão subir. Mas lembra lá em cima que se os preços subirem as pessoas desistem de viajar? Qual seria a solução para essa sinuca de bico?
As companhias aéreas vendem suas passagens através de diversos canais diferentes. Desde agências de viagens focadas em nichos até contratos diretos com grandes empresas multinacionais.
Cada um desses canais tem incentivos diferentes e preços que variam bastante, refletindo no preço público que será colocado no site da companhia aérea (e agências on-line), única opção que o comprador geral (população) tem acesso.
Isso não é perversidade das companhias, porque aqueles 80% de ocupação do breakeven só serão atingidos se o preço médio dos diversos canais estiver dentro dos custos de operação da aeronave.
É assim que se faz gerenciamento de receita há muito tempo. Mas com as tecnologias de hoje, será que não dá para melhorar a interação com os usuários/viajantes e entender melhor seu comportamento de preço?
Para que a retomada do setor aéreo seja menos traumática para empresas e consumidores, é preciso direcionar investimentos para iniciativas que façam sentido no novo normal, ou seja, deixando o antigo normal para trás.
Os usuários se sentem cada vez mais empoderados e participativos, portanto, podem ajudar as companhias nisso. Temos ferramentas como gamificação e inteligência artificial prontas para criar uma nova dinâmica de preços.
Talvez estejamos vivendo o momento mais adequado, e até mesmo necessário, para desafiar o status quo da precificação no mercado aéreo. Se adaptar agora é imperativo para saúde econômica das empresas e do país.
Dia desses, fiquei feliz em ver os CEOs das três maiores companhias aéreas do Brasil fazendo uma live em conjunto. Eles disseram que o momento não é de concorrência, mas de ajuda mútua para salvar toda uma indústria.
Entender de fato o novo consumidor, se abrir para novas tecnologias, desafiar o status quo da precificação e investir corretamente em iniciativas inovadoras no setor são alguns dos caminhos para que isso aconteça.
Artigo de Eduardo Ibrahim, especialista em Inteligência Artificial, professor da SingularityU Brazil e CTO da Trafega.com, e Renato Melo, CEO da Trafega.com