Com grande vocação para o turismo cultural, gastronômico e rural, o município de Carmo do Rio Claro está implementando um plano de desenvolvimento dos seus atrativos turísticos de uma forma seletiva e ordenada.
A cidade está localizada na região sudoeste de Minas Gerais. Em julho, empresários de hotéis, restaurantes, pousadas, entre outros comerciantes, fundaram a Associação Carmelita de Eventos e Turismo (Asceturis) para levar adiante as ações de expansão do turismo e a disponibilização da respectiva estrutura turística e hoteleira do município.
Banhada pela bela represa de Furnas, também chamada de ‘Mar de Minas’, o último levantamento oficial de Carmo do Rio Claro apontou uma população de 26 mil habitantes, que ocupam 1.065 km² de área territorial.
Hoje, a cidade conta cerca de 70 empresas que atuam no turismo e afins. Carmo do Rio Claro tem capacidade de 1 mil leitos distribuídos em pousadas e hotéis. Aproximadamente, metade dessas empresas já está associada à Asceturis.
A entidade quer aumentar os contatos e o relacionamento com agentes de viagens e turismo. A ideia é firmar em breve contratos de parcerias e desta forma elevar a taxa média de ocupação, sem que existam descompassos na operação.
No período de pico, como dezembro e janeiro, a taxa de ocupação chega a ser de 100%, assim como nos feriados. A proposta é elevar o número de eventos para dessa forma conquistar mais turistas ao longo do ano, de uma maneira segmentada e qualificada. Tudo para que não aconteçam assim problemas de afluxo de pessoas, além da capacidade instalada.
Pandemia
Segundo a presidente da Asceturis, Marli Lemos, a pandemia acabou unindo o setor, pois já havia boa estrutura de pousadas, hotéis e restaurantes, mas cada um lutava por si próprio. O Covid-19 dificultou a vida de todos, mas ao mesmo tempo, os empresários do setor em Carmo do Rio Claro entenderam que era preciso se reunir numa entidade de classe representativa, inclusive como instituição de interesse público, principalmente porque pretende-se agora trabalhar muito em parceria com o poder público.
Em tempos passados, a cidade teve um expressivo crescimento e depois houve uma certa redução na atividade turística. “Os investidores locais consequentemente concluíram que não poderiam ficar à mercê de governos e outras variáveis. Assim, acabamos concluindo que era preciso se unir numa organização para ter mais força a fim de alcançar os objetivos comuns de desenvolvimento”, explica Marli.
A taxa de ocupação média de pousadas e hotéis bate hoje nos 30%, porém antes da pandemia era paradoxalmente menor e oscilava entre 20% e 25%. Esse incremento pontual se deveu, principalmente, ao baixo índice de contaminados (70 casos) no período desde o início da crise sanitária.
“O número maior de turistas ocorreu principalmente pela confiança na infraestrutura disponível. A arquitetura das pousadas locais, por exemplo, é ampla e não precisam assim aglomerar hóspedes. Todas são espaçosas e quase não contêm corredores. Em boa parte delas, o hóspede não precisa sequer passar pela porta de um cômodo para chegar ao seu apartamento. Há muitas áreas abertas e jardins, e ainda espaços ao ar livre ao lado de locais de refeição e das piscinas”, descreve a presidente da Asceturis, que é proprietária também da pousada Varandas da Montanha.
Paulistas
A nova entidade do turismo carmelitano pretende estar mais presente em feiras de negócios em São Paulo para que o destino com isso apareça com frequência maior aos potenciais consumidores dos serviços de hotelaria, turismo, lazer e gastronomia.
Hoje, estima-se que o público que a estrutura local recebe deva ser em torno de 70% procedente do estado de São Paulo. Em sua maior parte, costuma vir de cidades como Ribeirão Preto, Campinas, Mogi das Cruzes, Valinhos e de outras regiões paulistas.
Estão previstas entre os planos básicos iniciais da Asceturis, ações em turismo náutico já que a represa de Furnas tem uma superfície d’água muito ampla no município, com 212 km², e agrupa bom número de embarcações de lazer. Há numerosas atividades que atraem visitantes para pesca esportiva e passeios de barcos.
Um ponto importante estratégico para Carmo do Rio Claro no turismo náutico é a mudança de legislação que estabelece a cota mínima de 762 metros de água para a represa de Furnas.
Quando houve no passado uma forte baixa do nível de água pela produção de energia elétrica, o problema provocou impacto no turismo regional, especialmente no náutico. Um passo essencial defendido pelos representantes da região seria a criação da carta náutica do Lago de Furnas, regulamentando dessa forma o controle da água, além da Proposta de Emenda à Constituição PEC 52/20, que prevê o tombamento do Lago de Furnas e da Bacia do Rio Grande. O ‘Mar de Minas’ tem capacidade de 15 bilhões de metros cúbicos de água, com um perímetro ao redor do lago de 3,5 mil km.
“A Cota Mínima 762, que todos lutamos por ela, vai dar sustentabilidade tanto para o negócio de energia elétrica, que é o objetivo principal da represa, como para a irrigação, piscicultura e, naturalmente, o turismo. É a cota mínima necessária para sustentar todos os negócios do local”, analisa a líder da Asceturis.
Turismo de Aventura
A região também irá contemplar o turismo de aventura, pois recebe muitos praticantes de paraglider e asa delta, com esportistas vindos de vários locais do país, em busca dos ventos e do relevo propícios para essas modalidades de ação.
Além do mais, as peculiaridades do lugar asseguram boas condições para a prática de outros esportes radicais como mountain bike, motocross e trilhas/trekking. Mas quem preferir atividades de lazer mais amenas, pode realizar cavalgadas muito prazerosas.
O turismo religioso também é parte das intenções do turismo metropolitano, uma vez que há uma boa quantidade de igrejas locais, com arquiteturas muito interessantes, que misturam o histórico com o moderno. A Paróquia Nossa Senhora do Carmo, por exemplo, impressiona pelo tamanho e suas linhas retas e modernas, além do seu acabamento esmerado.
Uma outra das integrantes do repertório é a Nossa Senhora da Aparecida, que está no alto da montanha da Serra da Tormenta, a 1,3 mil metros de altura. Já no sopé fica a capela barroca Nosso Senhor dos Passos. E às margens da represa de Furnas, está o charmoso santuário do Bom Jesus dos Aflitos.
Na lista de templos religiosos em Carmo do Rio Claro, há igrejas de outras crenças e denominações. Os fieis também mantêm tradições religiosas e folclóricas em eventos como Folias de Reis, Companhia do Menino Jesus e ainda na elaboração dos tapetes sobre as ruas da cidade, durante o feriado de Corpus Christi. As festas e tradições da cidade ajudam a receber os inúmeros interessados.
Turismo cultural
Completando o elenco de equipamentos públicos para o turismo cultural, há ainda o Museu Arqueológico Antônio Adauto Leite, que dispõe do maior acervo arqueológico indígena da América Latina. São dezenas de itens e peças, alguns com mais de 2 mil anos. Existem também inúmeros ateliers de tecelagem manual, que oferecem tecidos rústicos encorpados de algodão, com padronagens encantadoras.
Além do mais, há a culinária local, reconhecida principalmente pelos doces artesanais, compotas, pimentas em conserva e queijos, e uma infinidade de restaurantes especializados na tradicional cozinha mineira. Fazendas históricas que oferecem café colonial e fartos almoços completam as alternativas gastronômicas para o turista.
No que tange à parte rural, o Parque da Pedra Molhada apresenta ainda cachoeiras e piscinas naturais que são ótimas para o turista se refrescar, contemplando vistas incríveis do lago de Furnas. O menu cultural e de lazer dispõe ainda de feiras de artesanato e eventos como queima de alho e festa do peão.
Constam nas ações de incremento desse destino a ideia de se criar uma espécie de ‘enoturismo’ de cachaça, um cachaça tour. Há uma tradição da cidade de dispor de muitos alambiques, como por sinal ocorre em todo o estado mineiro. Entre as empresas expoentes do município neste segmento está a cachaça Coração de Minas, que é fornecedora da marca Sagatiba, da indústria italiana Campari, que exporta o produto para o mundo todo.
Muitas cachaças locais apresentam qualidade, mas ainda não são marcas famosas por terem um marketing ainda reduzido, contudo estarão mais expostas com este futuro programa de visitação e as novas ações planejadas.
Análise técnica
A consultora de negócios em turismo, Sara Souza, após uma visita de quatro dias ao destino considerou o local com grande potencial para retomada de crescimento, porque detém muitas atividades à disposição do visitante.
“Trata-se de uma cidade muito pacata e praticamente tímida na sua divulgação. Cidades vizinhas próximas souberam fazer divulgação de uma forma mais eficaz, enfatizando canyons e cachoeiras, e Carmo não deslanchou. O que não deixa de ter seu lado positivo”, avalia.
Em relação ao turismo seletivo, hoje, Carmo tem um trabalho mais focado, segmentando em vários tipos de público. Com isso, pretende ser um destino um pouco mais tímido que os vizinhos para que essa área tão bonita e tão verde permaneça vigorosa”, complementa ela.
Infelizmente, a cidade foi um destino muito famoso 10 anos atrás para o carnaval e também um espaço importante para campeonatos de asa delta. Hoje, ainda recebe competições, mas não tão fortes quanto antes.
“Continua sendo também um destino formidável para pesca esportiva, gastronomia e a visitação de alambiques, que têm uma história muito rica, em especial das tradicionais famílias proprietárias, além também das fazendas de café”, conta ela.
Segundo Sara, o plano turístico hoje contempla a capacitação dos moradores para entender a importância da imagem municipal, de como conhecer melhor sua própria cidade e porquê de se falar bem daquele destino. “Os habitantes não valorizam tanto a riqueza que Carmo do Rio Claro tem, então essa capacitação está no planejamento para fortalecer o trabalho”, diz ela.
A especialista informa que está previsto no plano turístico a construção de um píer público, porque ainda há dificuldades para embarcar com agilidade nos transportes fluviais.
A marca da cidade
A ideia hoje para a consultora é que Carmo seja reconhecida como a “cidade dos doces, artesanato, alambiques, pesca, agricultura e do café”. O projeto é fazer a divulgação para que os visitantes possam vir e conhecer esses atributos e que a cidade possa novamente retomar seus eventos e festivais tradicionais, ou mesmo que o turista possa atracar sua embarcação com mais tranquilidade e conforto no píer público.
“Há um forte trabalho junto à prefeitura, secretarias e a associação para implementar esse projeto”, diz ela. ”Assim que tivermos tudo formatado informaremos os agentes, com a criação de pacotes, que sejam a seguir vendidos pelas agências e operadoras”.
Texto: Paulo Pires
Fotos: Marcos Arruda e Paulo Pires