Em momentos de crise como o que estamos vivendo atualmente, diversos aspectos da vida cotidiana são diretamente afetados. E no mundo dos negócios não é diferente. “Estamos diante de um acontecimento inesperado que atinge a sociedade como um todo, afetando o equilíbrio econômico e financeiro de acordos firmados nas mais diversas áreas”, afirma o advogado Emanuel Pessoa, Mestre em Direito pela Universidade de Harvard.
Segundo ele, algumas obrigações e formalidades precisam se adaptar ao novo cenário e é necessário garantir que todas as partes envolvidas estejam de acordo para que nenhuma saia prejudicada.
É aí que entra em cena uma modalidade característica de períodos de incertezas: a renegociação de contratos. Pessoa aplica o método desenvolvido pela Universidade de Harvard para renegociar contratos de profissionais liberais e empresários em disputas comerciais, o que pode ser resolvido tanto amigavelmente, quanto na Justiça.
O método Harvard propõe sete etapas que auxiliam profissionais do Direito e também pessoas leigas a renegociar contratos de forma clara e objetiva, levando em conta as necessidades dos envolvidos.
A primeira etapa diz respeito aos interesses: é preciso satisfazer o desejo de ambas as partes. A segunda trata das opções: quanto mais opções forem criadas para firmar o negócio ou a renegociação, maiores as chances de fazer um bom acordo.
“A falta de opções parece um ultimato, ‘é pegar ou largar’. E muitas vezes, mesmo que um acordo sem opções seja muito bom, o outro lado pode rejeitar a proposta simplesmente por se sentir acuado e coagido”, alerta Pessoa.
Em seguida, vem a legitimidade: é preciso adotar um critério objetivo e justo para a negociação, ou seja, criar ganhos mútuos. “O locador que insiste em receber o aluguel completo imediatamente sem levar em conta o cenário atual não está percebendo que isso pode impedir o inquilino de ter o fôlego necessário para assim se recuperar ao longo do mês e também no pós-crise. Essa atitude pode fazer com que o locador perca aluguéis futuros, saindo ainda mais prejudicado”, explica Pessoa.
Nesse caso, o ideal é buscar um critério que não dependa exclusivamente da vontade dos envolvidos para contornar a situação e assim chegar a uma conclusão capaz de ajudar a todos, como usar o faturamento como medida da redução do aluguel.
A quarta etapa foca no relacionamento: entender o lado do outro proporciona um ambiente de confiança mútua, o que pode facilitar a negociação presente e também outras que possam surgir no futuro.
Em quinto lugar estão as alternativas: se não der certo o acordo, quais outros acordos são possíveis? Quanto mais houverem, melhor a capacidade de negociar. “Você se sente mais confiante a pedir mais, sem se sentir obrigado a aceitar condições injustas”, explica.
Em sexto lugar no método Harvard está a comunicação, fator fundamental para qualquer tipo de negociação. É importante saber conversar de forma clara, direta e precisa para não haver mal entendido e nem deixar passar batido partes importantes do contrato.
E por último vem o compromisso. A dica do advogado é não demorar para formalizar o que foi decidido: o ideal é utilizar palavras conclusivas como “fechado”, “combinado” ou “temos acordado” preferencialmente por escrito.
“Por conta do isolamento, é possível resolver a questão por WhatsApp ou e-mail, sendo que as duas partes devem manifestar se concordam ou não com os novos termos. Tudo isso vale como registro”, afirma o advogado.
Segundo Pessoa, agora é hora de priorizar despesas e acordos relacionados à sobrevivência, como alimentação e saúde, além das atividades necessárias para exercer a profissão ou operar a própria empresa.
Dessa forma, contratos de aluguel (para moradia ou espaço de trabalho), obrigações com funcionários, entre outros, podem ser ajustados levando em conta o interesse em comum de todos: manter as coisas funcionando normalmente de uma forma justa que seja positiva para ambas as partes.
Vale lembrar que em renegociações trabalhistas, todas as decisões devem ser feitas de acordo com a Medida Provisória 936, atualmente em discussão no Supremo Tribunal Federal. Qualquer negociação relacionada ao trabalho que não siga o trâmite legal está sujeita a ser questionada.
Para Pessoa, a atenção deve ser redobrada especialmente em tempos de crise já que muita gente está com os ânimos exaltados. Nesse caso, o ideal é deixar as emoções de lado e focar nos problemas a serem resolvidos. “A empatia é a melhor atitude neste momento”, comenta.
“Fazer um esforço para se colocar no lugar do outro e assim entender que a situação está difícil para todo mundo é fundamental. Os interesses de todos estão alinhados: ninguém quer que o empreendedor quebre, que o trabalhador seja demitido ou que o fornecedor não seja pago. Quando há esse entendimento as partes conseguem se acertar”, finaliza.